quinta-feira, 30 de abril de 2009

Blog na crise


Uma dessas situações estranhas da vida: no meio de uma tarde qualquer, no trabalho, você é surpreendido pela noticia que seu colega de trabalho descobriu seu blog. E está lendo-o.

Você morre de vergonha. E não se pode fazer nada contra isso, já que a rede está em todo lugar, e é pra todo mundo. No máximo tenta contextualizar o objeto virtual, garantir a ele algum sentido, um espaço no mundo, uma ordem, uma epígrafe, uma linha-do-tempo, um testemonial. Um rastro, pegadas.... Socorro!!!

- Meu outro blog era mais interessante (eu e a minha velha tendência à auto-depreciação)…

- Ahn.

- … era mais constrangedor (como se isso importasse)…

- Ahn…

- …aí um dia acabei com ele (e é uma historinha entediante)…

- É?

- …e este novo é só um esboço para alguma outra coisa que não sei qual (como se houvesse outra coisa)…

- Hmm.

- Mas não sou eu, é um personagem! (o tiro de misericórdia)

- Ainda não li tudo... Preciso ler mais um pouco pra ter uma opinião. 


Aí torço por uma versão atrasada do bug do milênio. E para que a crise das bolsas de valores afetasse finalmente a rede mundial. E me lembrei do quanto nunca quis ser a Paris Hilton. Nem ninguém famoso. Nem ninguém minimamente conhecido. Se o Chico Buarque tocar a campainha aqui de casa, faço de conta que não estou. 

Mas, felizmente, blog é aquela coisa: há sempre o caso do leitor que detesta, toma raiva, fica enfezado e nunca mais volta. Nos meus surtos de blogfobia, vivo me apegando a essa possibilidade.    

tomorrow...

Tudo que eu quero é escrever algo que não me decepcione na manhã seguinte.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Etapa da vida...


Existe uma etapa da vida em que simplesmente abandonamos tudo aquilo que não nos agrada?

Que aprendemos a passar à margem do que nos deixa insatisfeitos?

Que desistimos em definitivo das segundas chances?
Que ficamos apenas com o que e quem nos importa?

Vai sonhando....


Vai sonhando, sonha que passa...


vai esperando, acha jeito de ser forte


vai levando, acha bom e acha graça


porque como dizem aqueles sábios;


é muita bobagem pouca desgraça


mantém esse sorriso nos lábios


espera feliz a chegada da sorte/morte



quarta-feira, 15 de abril de 2009

O resto é ruído


Minha nova e desafiadora tarefa pra esse mês de abril, cheio de feriados, casamento do meu irmão, viagens atarefadas e dias cada vez mais curtos já foi lançado; O livro de O resto é ruído de Alex Ross. Critico musical da revista New Yorker.


Pois o senhor Ross se aventurou numa tarefa hercúlea e se deu muito bem! Resolveu contar a historia da musica erudita no século passado e de quebra, acabou contando a historia do século xx através de sua musica.
Ross vai trazendo todo o seu conhecimento musical solido e costurando com acontecimentos históricos, conjunturas sociais, politicas e culturais que de forma direta, indireta ou paralela, pautaram as rupturas, movimentos e inovacoes musicais principalmente na Europa e USA.


Sem preconceitos, o autor mostra a elitista e as vezes difícil vanguarda musical como algo próximo e presente. Mostra com riqueza de informação e com um estilo agradável de ler, como a musica acabou sendo incorporada por formas populares de cultura, como o cinema, e traçando um caminho ate nomes de peso como John Coltrane e bandas como Beatles e Velvet Underground.


O texto vem acompanhando os acontecimentos desde a efervecencia de Viena no começo do século, passando pelas duas grandes guerras mundiais e guerra fria, ate o saculejo cultural da década de 60 e 70. Entra no contexto em que viveram e desmistifica cabeças de compositores como Stravinski, Strauss, Schoenberg e o doido do Stockhausen, por exemplo. Apresenta de uma forma clara, contextualizada e interessante, propostas musicais como o minimalismo, dodecafonismo e serialismo, alem de rastrear de onde vieram e o que influenciaram posteriormente.


Alem de uma grande aula de historia da musica, o livro traz uma deliciosa aula de historia do século XX, com uma caprichada trilha sonora!
PS. Escrevo isso, ainda da metade do livro... Provavelmente minha recomendação se tornará mais enfática ainda quando der cabo das 670 paginas.

Choveu Hoje


Choveu hoje...


Destampou-se o céu e caiu agua.


Por causa dessas preguiças mal corrigidas, a gente sempre quer ficar em casa, olhar a chuva de dentro da proteção de um livro, uma xícara de chá e pés quentes.


Mas a agua veio sem clemencia e as poças foram se emendando, se apressando a correr pela rua.


Choveu agua por cima. E em dias assim, em cidades assim, por incrível que pareça, choveu agua por baixo!

sábado, 11 de abril de 2009

Paixão de Infância


Uma paixão de infância que até hoje me tira do sério.

Prosa X Poesia


Sou um grande fã de futebol. Pratico, assisto e tento, na medida do que cada dia mais se faz difícil, enxergar o lado poético e lúdico do esporte inglês que nós, brasileiros tomamos como nosso.

Confesso, no entanto que tenho certa preguiça de assistir lances de jogos antigos de futebol. Aqueles lances em preto e branco em que a bola parece ter velocidade diferente do normal. Os jogadores, todos cinzinhas, com uniformes que muitas vezes não se distinguem, correndo pra lá e pra cá, quando de repente; Gol!
Mas nisso não se mexe! São tempos áureos em que nossos primeiros heróis brilharam... Além do que, na memória da geração anterior a minha, que assistiu a todos esses lances ao vivo, tudo era colorido. Alias, muitas vezes há até mais cores nas memórias dos saudosistas do que realmente se pintou então. Fato é, que tudo tinha cor. Ou achamos nós, acostumados a ver cenas retratadas nas cameras em preto e branco, que na época, nossos pais iam ao Maracanã, Mineirão, Morumbi e viam os jogadores em preto e branco? Não! A vida com certeza tinha cor!

A cor que a vida tinha, com certeza era mais colorida que a de hoje. Não por saudosismo, mas era um acontecimento ir ao estádio, assistir jogos de futebol. Um tempo de torcer com mais coração, mais ingenuidade na arquibancada e no campo. Diferente de hoje que o futebol se apresenta como um grande negócio, uma grande vitrine em que tudo parece ensaiado e decorado! O politicamente correto se apoderou das entrevistas cada vez mais decoradas dos jogadores à beira do campo. Sempre a mesma ladainha, no mesmo tom de voz, com as mesmas palavras... Não tenho a mínima intenção de ficar reclamando, dizendo que as coisas viraram insosas, sem graça e que antes, a coisa era melhor e tal... O que queria, era sim, um pouco mais de graça, de vida, de ardência nos que defendem as cores de uma seleção de futebol.

No meio de toda essa paradeza, toda essa mornidão e toda essa apatia, acabo tendo dificuldade de censurar uma atitude como a de Zidane na final da copa de 2006 em que ao ouvir poucas e boas de Materazzi, volta-se pra ele e desfere uma cabeçada, sem nenhuma vontade de levar desaforo de volta pra França! Errado, sim. Mas pelo menos vimos um pouco de sangue quente, calor da disputa e ardência! Allez le Bleu!!! Cores!!!!

Nasci depois do preto e branco. A primeira copa que me lembro foi a de 1982, em que meu pai, animado com a ocasião, comprou uma televisão colorida pra assistirmos o torneio mundial! Desde então, lembro de tudo, em cores e sabores de derrotas e vitórias que nossa seleção nos ofereceu nesses anos todos.

O futebol pra mim é assim; me traz lembranças de conversas, reuniões e encontros felizes. Afinal, somos 4 homens em casa (Coitada da minha mãe). Tudo isso em cores e muita poesia. Aumentamos a intensidade das lembranças! As derrotas soam amargas e as vitórias, explosões de êxtase! Meu filho ouvirá as coisas assim, aumentadas pelas edições da minha memória romântica...

Píer Paolo Pasolini, após a final da Copa de 1970, escreveu um interessante artigo em que analisa o futebol como uma linguagem não-verbal em que jogadores cifram e torcedores decifram um mesmo código. Pasolini constrói uma série de analogias pra chegar a conclusão de que o futebol de poesia da seleção brasileira havia vencido a prosa estetizante da seleção italiana naquela final.

Pasolini argumenta que por motivos histórico-culturais o futebol de alguns países se aproxima da prosa e outros da poesia. O gol seria sempre um elemento poético, uma subversão aos padrões do código, perturbação da paz. Assim como o drible. O autor então lança a pergunta: Quem são os melhores dibladores do mundo e os melhores fazedores de gol??, a resposta que consegue já conhecemos: são os brasileiros, que, por isso podem ser classificados como fazedores de um futebol de poesia. O futebol de prosa se submete a um sistema, onde a organização coletiva do jogo e as regras de sua dinâmica seguem as regras do código de tal modo que se espera de um poeta realista o arremate final: o gol. Aí se formam elipses, se entram em espaços inventados e a escrita dos jogos entre prosa e poesia, se forma a cada 90 minutos de bola rolando.

Engraçadas essas fabulações! Resolvi especular sobre essa intuição pensando nas seleções recentes: Josué, Juan, Lúcio e Gilberto Silva seriam primordialmente prosadores ?! Elano e Juninho Pernambucano trariam uma poética sólida, ?de pedra? e com pendor épico. Robinho tenderia para os versos livres e Ronaldinho Gaúcho? Consenso talvez seja afirmar que Ronaldo seja primordialmente um poeta épico...lembrando de outros: Romário seria na grande área um mestre hai kai...e Pelé? E Garrincha?

Difícil saber...

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Yesterdays


O trio de Keith Jarret é, para mim, uma das escassas provas de que a incessante busca pela perfeição leva a algum lugar. Jarrett, Gary Peacock e Jack DeJohnette não têm, no entanto, nada de celestiais ou etéreos: são cem por cento terrenos. Lutam humanamente por uma qualidade cada vez melhor de sua musica. Encarnam os momentos em que o homem inventa universos, sistemas, complexidades e, sobretudo, a simplicidade.

“Yesterdays" saiu no começo de 2009 pela gravadora ECM, das raras gravadoras que ainda focam o catálogo em música francamente “impopular”, ou seja, que não enriquece exorbitantemente executivos e artistas e nem mede qualidade por números e vendas. Investe em musica de qualidade. A novidade é que, seguindo a tendência atual, pra quem gosta, o disco também é editado em vinil. Pra nos, que moramos no Brasil, nos resta importar ou contar com a sorte de achar numa busca em lojas que ainda resistem por ai...

Os nove standards do disco são gravações mais antigas. Estas particularmente estão guardadas desde abril de 2001, realizadas ao vivo em Tóquio, também o berço mais mais freqüente dos jazzistas atuais. Como uma iguaria ou um vinho, as safras de Jarrett são assim, ficam suspensas por um tempo antes de serem embaladas com a técnica perfeita de gravação e os encartes cheios de fotos e silêncios, sem texto.

A viagem de Jarrett pela grande canção americana não tem fim. Mas a cada vez toma um caminho, sempre surpreendente – de certa forma mais surpreendentes do que os espantosos solos, em que improvisa radicalmente, sem rede de protecao. Nesta gravação, o que chama mais atenção é o caminho mais bop, com Horace Silver (“Strollin’”) e Charlie Parker (“Scrapple from the apple” e “Shaw’nuff”) e uma versão de “A sleepin’ bee”. Ou ainda a mistura de invenção e jazz clássico de “Smoke get in your eyes”, com uma lindíssima introdução solo de um minuto e meio.

Como em todo lançamento do trio, “Yesterdays” só me faz pensar no que ainda deve estar guardado. O que não deixa de ser uma garantia de felicidade a prazo pelos anos que virão.